sexta-feira, 28 de outubro de 2022

A dor dos outros

A dor dos outros
Está fora da janela.
Entristece-nos
Como um ciclo de chuvas
Mas não nos molha os pés
Nem os cabelos.

Por vezes avistamo-la
Na soturna rua
Que a medo atravessamos.
Ou no café
Onde uma mão se estende.

Vamos então ao armário maior
Buscar o dó, a pena.
E ao porta-moedas 
Rebuscar uns trocos.

Alguns de nós
Mas poucos, muito poucos,
Guardam bagas
Que o tempo lhes ditou.
Verdades que hibernaram
No gelo das idades
E germinaram em caverna escura.

Só esses têm coragem de ver
Que a dor dos outros
É sempre a nossa dor
Que anda em viagem.
E que, curvada,
Ao peso da bagagem
Nos persegue
E procura

Isabel Fraga

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